Monday, October 10, 2011

Vale do Tua. Até quando?


A harmoniosa convivência entre o rio e a linha férrea, ao longo de mais de um século, fazem do Vale do Tua um exemplo de como o progresso e a natureza podem conviver em perfeita simbiose. E é este património único, deixado pelos nossos antepassados, que está a ser destruído, com o aval de governantes e gente indiferente aos muitos gritos de protesto!
A Linha do Tua, que acompanha o rio Tua ao longo do vale, é uma obra de engenharia excepcional, perfeitamente integrada na dureza do local escarpado onde foi construída. Projectada em 1878, levou anos a ser construída e mereceu a visita de reis, rainhas, ministros, bispos, artistas, entre outras personalidades da história do país. Esta linha de caminho de ferro é considerada uma das mais belas linhas férreas de montanha da Europa.
Viajar na Linha do Tua é uma viagem no tempo, na história e na natureza; percorrer o Vale do Tua e uma paisagem magnífica, escarpas medonhas que pontuam aqui e ali o rio, que corre livre; as encostas metem respeito, mas a fauna e a flora continua a descobrir-se a cada momento, num simples desvio do olhar… A Linha do Tua é o melhor meio de acesso, único em muitos pontos, para se conhecer e viver o vale do Tua e Trás-os-Montes na sua plenitude, para o percorrer.
Lá no fundo, junto ao rio, o céu parece mais distante. Talvez porque estamos no paraíso. Aqui sente-se o pulsar do planeta! A natureza foi generosa com águas sulfurosas em ambas as margens do Tua, Carlão e São Lourenço…que privilégio o nosso! E somos tão pequenos perante esta imensidão que não nos resta senão contemplar a natureza e meditar.
Se os decisores políticos descessem a este pedaço de mundo e o sentissem, perceberiam a importância do Vale do Tua…para as suas gentes, para nós, e para tantos outros.
E como é incompreensível que esteja a ser construída uma barragem desta dimensão em pleno Douro Vinhateiro, Património da Humanidade, classificado pela UNESCO, entidade já formalmente informada pela Quercus A.N.C.N. Na Foz do rio Tua, estão a ser destruídos muros centenários, oliveiras, azinheiras, freixos, salgueiros, toda a vegetação ribeirinha do rio Tua, em plena época de nidificação de diversas espécies.
Esta barragem, a ser construída, afectará de modo irremediável o ecossistema do Vale do Tua, último reduto de várias espécies de flora e fauna (em termos de avifauna semelhante ao Douro Internacional e ao Sabor) já em termos de quirópteros (morcegos) como é admitido no EIA ficaram muitos refúgios por conhecer devido à sua inacessibilidade. Abriga ainda espécies protegidas de répteis e mamíferos segundo os respectivos livros vermelhos de Portugal.
De forma impune as máquinas avançam na tentativa de construírem um gigantesco muro de betão, para a tão propagandeada Barragem de Foz Tua.
Em causa está também o cumprimento da Directiva Quadro da Água, por destruição da qualidade da água. A eutrofização de uma tão grande massa de água parada será evidente; a consequente deterioração da qualidade da água levará a que sejam aplicadas sanções a Portugal, uma vez mais com custos para os contribuintes.
A navegabilidade do Douro está em risco, segundo comunicação do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, da foz do rio Tua para montante. De acordo com esta entidade, a verificar-se esta situação, estão seriamente comprometidos centenas de postos de trabalho relacionados directa ou indirectamente com o turismo fluvial e o turismo rural. E quem se responsabilizará no futuro, apesar dos alertas feitos?
A construção da Barragem de Foz Tua provocará a perda irremediável da Linha do Tua tal como a conhecemos; o comboio é o único transporte público para muitas populações ribeirinhas, e o garante da mobilidade na região com a sua ligação à Linha do Douro e aos maiores centros populacionais; património reconhecidamente potenciador de turismo e de desenvolvimento económico na região, a Linha do Tua juntamente com a Linha do Douro, permitiria além da travessia de Trás-os-Montes, a ligação a Puebla de Sanábria e à Alta Velocidade espanhola, a ligação de 5 importantes patrimónios classificados pela Unesco (Guimarães, Porto, Douro Vinhateiro, Côa e Salamanca). O turismo ferroviário e cultural são alavancadores do desenvolvimento e do crescimento populacional.
A Linha do Tua percorre Trás-os-Montes, serve as gentes locais, transporta milhares de visitantes de todos os cantos do mundo. O que pode ganhar um país quando destrói uma linha férrea centenária que atravessa toda uma região interior que não tem outra alternativa que não uma futura auto-estrada com elevadas portagens?
Por estas e muitas outras razões, estão em risco os últimos dois pilares de desenvolvimento da Região de Trás-os-Montes e Alto Douro: a Agricultura e o Turismo. Recorde-se que estas duas actividades não são deslocalizáveis e são de alto valor acrescentado.
Os impactes da construção desta barragem são irreversíveis e hipotecam para sempre o futuro de Trás-os-Montes, considerada já a sub-região mais pobre da Europa dos 27, conforme estudo publicado há alguns meses atrás pela Comissão Europeia.
No actual momento que vivemos, de crise económica constantemente lembrada, não há moralidade, responsabilidade e visão politica para pensar e rever o modelo de desenvolvimento que se quer para o país?
Há que diminuir o fosso entre quem vive no litoral e grandes centros urbanos e quem sobrevive num interior cada vez mais despido de tudo, até de identidade e originalidade. Porque nos tiram tudo. Até quando?
QUERCUS A.N.C.N – NÚCLEO REGIONAL DE VILA REAL E VISEU
Bairro da Araucária, Bloco G, Cave 7
5000-584 VILA REAL

No comments: