Thursday, October 13, 2011

Comunicado - Movimento Cívico pela Linha do Corgo

Comunicado
Movimento Cívico pela Linha do Corgo

Pedro Passos Coelho, cabeça de lista por Vila Real nas últimas eleições legislativas, ex Presidente da Assembleia Municipal de Vila Real, e actual Primeiro-Ministro de Portugal, defendeu em Maio do corrente ano, volvidos 2 anos e 2 meses sobre o abrupto encerramento do troço Régua – Vila Real da Linha do Corgo, o seguinte:

Quando a linha (do Corgo) foi encerrada à circulação, o Governo assumiu que era temporariamente. A verdade é que o tempo vai passando e o Governo faz o facto consumado de vir dizer agora, como estamos em grandes dificuldades financeiras, que já não se poder fazer a remodelação que estava prevista.

Ora isso não pode ser. Nós precisamos de ter investimento de mais proximidade que crie mais emprego e seja mais produtivo e investir menos em coisas onde se fizeram mal as contas e que vão provocar prejuízos de milhões e milhões de euros que nos vão custar muito a pagar nos próximos anos.

Em Outubro do mesmo ano, apenas 5 meses após estas palavras, um Ministro do seu executivo anuncia o encerramento definitivo da Linha do Corgo, sem apelo nem agravo, em nome de um equilíbrio de contas ferroviárias tentado sempre à custa do encerramento de vias-férreas como a do Corgo, e sempre com resultados desastrosos.

Sublinhamos que em 1992, último ano da hecatombe ferroviária promovida por Cavaco Silva, na qual foram encerrados 900 km de vias-férreas em apenas 5 anos, também à época apelidadas de “altamente deficitárias”, o défice da CP era de 178 milhões de euros, buraco o qual em 2008 já tinha aumentado 143% para 433 milhões de euros. No mesmo período de tempo, 11 mil ferroviários cessaram as suas funções, e os custos com administração cresceram 110%, enquanto a política de horários desajustados prosseguiu, juntamente com o encerramento de dezenas de estações e um investimento na manutenção da via cada vez menor.

Em 2010 a REFER deu-se ainda ao luxo de gastar 67 milhões de euros na Variante da Trofa, percurso inteiramente novo da Linha do Minho, com apenas 3 km de extensão (22 milhões de euros por quilómetro!!!), por inteiro capricho de um ex autarca da Trofa, dado este não desejar a Linha do Minho dentro desta localidade. O que sobeja para capricho de uns, daria para reabrir a Linha do Corgo entre a Régua e Vila Real, pelas contas da própria REFER, TRÊS VEZES!

A farsa de 30 anos de que só encerrando as ditas “vias secundárias” será possível equilibrar as contas das empresas públicas ferroviárias valeram a Portugal a incrível posição de único país da Europa Ocidental a perder passageiros nos últimos 20 anos, quando os horários, serviços e a própria manutenção destas mesmas vias se reduzem a mínimos e esquemas abusivos e insultuosos, raiando mesmo o criminosos.

Não podemos continuar a compactuar com esta abjecta aldrabice, que atirou Trás-os-Montes e Alto Douro quase em exclusivo para os braços mortais da rodovia, estrangulando o desenvolvimento regional e hipotecando o seu futuro, sem outro tipo de alternativas de escoamento de produtos e movimentação dos seus habitantes e visitantes, entre os quais se contam inúmeros cidadãos desfavorecidos, naquela que foi considerada no ano transacto a região mais pobre de toda a União Europeia. Com uma A24 portajada, uma viagem da Régua a Chaves (73 km em auto-estrada) só em portagens ficará por € 6,40 (uma viagem na A1 entre Alverca e Torres Novas, de 82 km de comprimento, custa em portagens € 5,65, tornando as portagens da A24 um autêntico saque aos trasmontanos), o que de comboio custaria à volta de € 8,20. No entanto, € 8,50 é o que um automóvel a gasolina gastará em combustível para ir da estação da Régua à de Chaves (consumo de 6,5 litros aos 100 km, gasolina a € 1,50 o litro), num percurso de 87 km (menos 9 km apenas do que o mesmo percurso pela Linha do Corgo), fazendo com que este trajecto custe no total e para este exemplo uns proibitivos € 14,15, contra € 8,20 de um bilhete inteiro em tarifa Regional para o comboio – em termos de passe mensal a diferença por viagem é ainda mais significativa.

Já os custos para o transporte de mercadorias, principalmente aquelas que enfrentarão pela Europa a fora tarifas ecológicas nas auto-estradas, e com o contínuo aumento do preço dos combustíveis, o sentido único promovido em Portugal para a rodovia será uma autêntica sentença de morte para várias empresas e uma bomba relógio para a Economia.

Desta forma, o MCLC convida todos os trasmontanos mas também todos os portugueses a unirem a sua voz de descontentamento contra o falacioso encerramento da Linha do Corgo! Aceda à PETIÇÃO PELA LINHA DO CORGO em http://peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx?pi=P2011N15067, ou através do site do MCLC em http://linhaferroviariadocorgo.wordpress.com/.

Todos juntos não seremos demais!

Vila Real, 12 de Outubro de 2011.

--
Movimento Cívico pela Linha do Corgo

--

Tuesday, October 11, 2011

Comunicado conjunto sobre o despacho que autoriza abate de milhares de sobreiros e azinheiras


 
O Governo, para viabilizar a construção da barragem da Foz do Tua, vem agora emitir um Despacho para autorização do abate de milhares de sobreiros e azinheiras no Vale do Tua, afectando de modo irremediável o património natural do Vale do Tua, um dos melhores conservados de Portugal.
A barragem estará situada dentro da Paisagem Cultural do Douro Vinhateiro, classificada como Património Mundial. Após um controverso processo de Avaliação de Impacte Ambiental, foi efectuada uma queixa à UNESCO, alertando para a desactivação da linha do Tua e para a afectação negativa da paisagem com a construção da barragem.
A publicação do Despacho n.º 13491/2011, de 10 de Outubro do Ministério da Economia e Emprego e do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, com a necessária Declaração de Imprescindível Utilidade Pública, vem viabilizar à EDP S.A., o abate de mais de 1104 sobreiros e 4134 azinheiras em povoamentos e núcleos de valor ecológico elevado no Vale do Tua.
Questionamos a consideração da inexistência de alternativas válidas para a construção do empreendimento, quando as mesmas não foram estudadas ao nível da Avaliação de Impacte Ambiental.
Lamentamos o avanço do processo de construção da barragem, a qual a ser construída, produzirá o equivalente apenas a 0,07% da energia eléctrica consumida em Portugal em 2006 (Dados da Rede Eléctrica Nacional). Mais uma vez andamos em contraciclo, construindo barragens irrelevantes quando os países mais avançados já iniciaram a demolição das barragens com pouca utilidade.
Num momento em que cada vez mais vozes se levantam contra o desperdício e o buraco económico que representa a construção de novas barragens, este despacho representa uma inaceitável subserviência à política de publicidade enganosa e facto consumado promovida pela EDP. É também um desrespeito vergonhoso às promessas feitas pelo Governo de reavaliar o programa nacional de barragens.
Lisboa, 11 de Outubro de 2011
QUERCUS, GEOTA, CAMPO ABERTO, ALDEIA, LPN, FAPAS,
COAGRET, MCLT, ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DO VALE DO RIO TUA
Para mais informações contactar João Branco (Quercus –ANCN) 96 453 47 61; João Joanaz de Melo (GEOTA) 96 285 30 66

Monday, October 10, 2011

Vale do Tua. Até quando?


A harmoniosa convivência entre o rio e a linha férrea, ao longo de mais de um século, fazem do Vale do Tua um exemplo de como o progresso e a natureza podem conviver em perfeita simbiose. E é este património único, deixado pelos nossos antepassados, que está a ser destruído, com o aval de governantes e gente indiferente aos muitos gritos de protesto!
A Linha do Tua, que acompanha o rio Tua ao longo do vale, é uma obra de engenharia excepcional, perfeitamente integrada na dureza do local escarpado onde foi construída. Projectada em 1878, levou anos a ser construída e mereceu a visita de reis, rainhas, ministros, bispos, artistas, entre outras personalidades da história do país. Esta linha de caminho de ferro é considerada uma das mais belas linhas férreas de montanha da Europa.
Viajar na Linha do Tua é uma viagem no tempo, na história e na natureza; percorrer o Vale do Tua e uma paisagem magnífica, escarpas medonhas que pontuam aqui e ali o rio, que corre livre; as encostas metem respeito, mas a fauna e a flora continua a descobrir-se a cada momento, num simples desvio do olhar… A Linha do Tua é o melhor meio de acesso, único em muitos pontos, para se conhecer e viver o vale do Tua e Trás-os-Montes na sua plenitude, para o percorrer.
Lá no fundo, junto ao rio, o céu parece mais distante. Talvez porque estamos no paraíso. Aqui sente-se o pulsar do planeta! A natureza foi generosa com águas sulfurosas em ambas as margens do Tua, Carlão e São Lourenço…que privilégio o nosso! E somos tão pequenos perante esta imensidão que não nos resta senão contemplar a natureza e meditar.
Se os decisores políticos descessem a este pedaço de mundo e o sentissem, perceberiam a importância do Vale do Tua…para as suas gentes, para nós, e para tantos outros.
E como é incompreensível que esteja a ser construída uma barragem desta dimensão em pleno Douro Vinhateiro, Património da Humanidade, classificado pela UNESCO, entidade já formalmente informada pela Quercus A.N.C.N. Na Foz do rio Tua, estão a ser destruídos muros centenários, oliveiras, azinheiras, freixos, salgueiros, toda a vegetação ribeirinha do rio Tua, em plena época de nidificação de diversas espécies.
Esta barragem, a ser construída, afectará de modo irremediável o ecossistema do Vale do Tua, último reduto de várias espécies de flora e fauna (em termos de avifauna semelhante ao Douro Internacional e ao Sabor) já em termos de quirópteros (morcegos) como é admitido no EIA ficaram muitos refúgios por conhecer devido à sua inacessibilidade. Abriga ainda espécies protegidas de répteis e mamíferos segundo os respectivos livros vermelhos de Portugal.
De forma impune as máquinas avançam na tentativa de construírem um gigantesco muro de betão, para a tão propagandeada Barragem de Foz Tua.
Em causa está também o cumprimento da Directiva Quadro da Água, por destruição da qualidade da água. A eutrofização de uma tão grande massa de água parada será evidente; a consequente deterioração da qualidade da água levará a que sejam aplicadas sanções a Portugal, uma vez mais com custos para os contribuintes.
A navegabilidade do Douro está em risco, segundo comunicação do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, da foz do rio Tua para montante. De acordo com esta entidade, a verificar-se esta situação, estão seriamente comprometidos centenas de postos de trabalho relacionados directa ou indirectamente com o turismo fluvial e o turismo rural. E quem se responsabilizará no futuro, apesar dos alertas feitos?
A construção da Barragem de Foz Tua provocará a perda irremediável da Linha do Tua tal como a conhecemos; o comboio é o único transporte público para muitas populações ribeirinhas, e o garante da mobilidade na região com a sua ligação à Linha do Douro e aos maiores centros populacionais; património reconhecidamente potenciador de turismo e de desenvolvimento económico na região, a Linha do Tua juntamente com a Linha do Douro, permitiria além da travessia de Trás-os-Montes, a ligação a Puebla de Sanábria e à Alta Velocidade espanhola, a ligação de 5 importantes patrimónios classificados pela Unesco (Guimarães, Porto, Douro Vinhateiro, Côa e Salamanca). O turismo ferroviário e cultural são alavancadores do desenvolvimento e do crescimento populacional.
A Linha do Tua percorre Trás-os-Montes, serve as gentes locais, transporta milhares de visitantes de todos os cantos do mundo. O que pode ganhar um país quando destrói uma linha férrea centenária que atravessa toda uma região interior que não tem outra alternativa que não uma futura auto-estrada com elevadas portagens?
Por estas e muitas outras razões, estão em risco os últimos dois pilares de desenvolvimento da Região de Trás-os-Montes e Alto Douro: a Agricultura e o Turismo. Recorde-se que estas duas actividades não são deslocalizáveis e são de alto valor acrescentado.
Os impactes da construção desta barragem são irreversíveis e hipotecam para sempre o futuro de Trás-os-Montes, considerada já a sub-região mais pobre da Europa dos 27, conforme estudo publicado há alguns meses atrás pela Comissão Europeia.
No actual momento que vivemos, de crise económica constantemente lembrada, não há moralidade, responsabilidade e visão politica para pensar e rever o modelo de desenvolvimento que se quer para o país?
Há que diminuir o fosso entre quem vive no litoral e grandes centros urbanos e quem sobrevive num interior cada vez mais despido de tudo, até de identidade e originalidade. Porque nos tiram tudo. Até quando?
QUERCUS A.N.C.N – NÚCLEO REGIONAL DE VILA REAL E VISEU
Bairro da Araucária, Bloco G, Cave 7
5000-584 VILA REAL

Thursday, October 11, 2007

Pedido de ajuda e colaboração

Para todos os que se preocupam verdadeiramente com o caminho de ferro em geral e com a continuidade da linha do Tua em particular solicitamos a vossa ajuda e colaboração

enviem pf sugestões, formas de colaboração , formas de luta ,apoios.... todo o tipo

divulguem por favor


Mail linhadotua@gmail.com
www.linhadotua.net

Declaração Política sobre a barragem do Tua


Declaração Política da

Deputada Heloísa Apolónia (“Os Verdes”) sobre o Programa Nacional de Barragens, proferida na Assembleia da República a 11 de Outubro de 2007

Sr. Presidente

Srs. Deputados

Está em discussão pública o Programa Nacional de Barragens. Depois de se ler o programa e o seu relatório ambiental acaba até por ser confrangedor ouvir declarações do Sr. Ministro do Ambiente a alegar que as razões ambientais estiveram na base da selecção da localização destes empreendimentos. Aquele membro do Governo que deveria ser o guardião do património ambiental e da valorização desse património, é aquele que anui em projectos que destroem o potencial que este país tem em termos ecológicos.

O primeiro grande erro crasso deste Programa é constatar que os consumos de electricidade têm crescido constantemente e aceitar piamente que essa realidade é para continuar e que, assim, há que encontrar mecanismos para servirem esse aumento de consumo de electricidade. Portanto, todo o discurso sobre aumento de eficiência energética, sobre a imperativa alteração do paradigma de consumos com vista à poupança energética está visto que é mesmo só discurso e que não constitui qualquer objectivo do Governo.

Por outro lado, o Programa aposta nas grandes barragens, em detrimento da produção mais localizada, sabendo-se, como hoje se sabe, que a perda no transporte de energia ronda os 60%, o que dá bem conta do desperdício energético que existe neste país. A aposta na produção localizada e sustentada, com grande peso para a micro-geração deveria ser o caminho a prosseguir, em detrimento de mega-projectos que delapidam o nosso património natural e que inviabilizam potencialidades de desenvolvimento agregadas a esse património.

Uma das grandes lacunas do estudo ambiental do Programa de Barragens é a avaliação dos impactos desta barragem sobre o litoral. Andamos sempre a falar da fragilidade do nosso litoral, das agressões que sobre ele se cometem, da erosão da nossa zona costeira e, sabendo do grande impacto que as barragens têm sobre o entrave ao transporte de sedimentos, decide-se, assim, construir 10 grandes barragens sem aferir pormenorizadamente do impacto que vão ter sobre o litoral. Isto é no mínimo irresponsável.

Dir-se-á, mas isso será avaliado no estudo de impacte ambiental que posteriormente será feito sobre cada uma das 10 barragens. Será? Mas esse, Srs. Deputados, é outro dos grandes logros deste programa. Esta lógica demonstra bem para que servem os Estudos de Impacte Ambiental em Portugal. Primeiro decide-se o que se vai construir e onde e depois faz-se um estudo de impacto ambiental, que já não terá qualquer peso sobre a decisão de construção dos projectos e da sua localização.

Mas este Programa também revela bem para que serviu verdadeiramente a nova lei da água. O Programa de Barragens revela que vai provocar a degradação da qualidade das águas e piorar o estado dos ecossistemas aquáticos e as zonas húmidas dependentes. Uma lei tão apregoada para garantir a boa qualidade das águas num país saturado pela intensificação da poluição dos seus recursos hídricos, afinal, como “Os Verdes” denunciaram na altura, tinha como verdadeiro objectivo a fixação dos direitos daqueles a quem é atribuída a gestão do recurso água, com poderes de licenciamento e de usos durante décadas e décadas, numa lógica de privatização real de patrimónios colectivos.

Este Programa de Barragens despreza os valores patrimoniais e ambientais, que, se valorizados, são inegavelmente factores de desenvolvimento e de melhoria das condições de vida das populações e das regiões.

A barragem que é proposta para a Foz do Tua é bem demonstrativa disso mesmo. O relatório ambiental quando procede à avaliação sumária deste empreendimento omite inexplicavelmente um conjunto de parâmetros que fazem parte da realidade regional, que só se pode entender que nunca sejam referenciados por constituírem uma incalculável perda, que ao ser tida em conta muito pesaria para não se optar pela construção dessa barragem.

Como é possível que o impacto paisagístico numa das mais belas zonas do Tua (Fragas más) seja omitida no estudo? Como é possível que a classificação pela UNESCO de zonas, de Carrazeda de Ansiães e Alijó, como património da humanidade, que serão afectadas, seja omitida? Como é possível que a linha ferroviária do Tua, considerada a terceira mais bela via estreita do mundo seja completamente omitida nos parâmetros de avaliação dos efeitos de uma barragem que se propõe submergir, como refere o estudo, 35Km dessa linha? Depois do desastre ecológico irreparável que vai constituir a barragem do Sabor, a riqueza patrimonial de Trás-os-Montes tem de continuar a ser sacrificada com a construção de mais barragens? E esta é justamente uma das barragens que o estudo confere que não vai reflectir-se em melhoria do rendimento nem num maior bem-estar das populações da região, ao contrário, vai eliminar elementos que podem contribuir para o seu rendimento, como o solo e uma linha ferroviária com potencialidades de se articular com a linha do Douro e com a ligação a Espanha.

Sr. Presidente

Srs. Deputados

Os sucessivos Governos têm insistido em deixar uma marca de poder associada a grandes obras, a grandes empreendimentos – foi assim com as auto-estradas, com pontes e edificações, e para esse efeito estas barragens servirão na perfeição. Mas para as necessidades do país este programa de barragens é notoriamente desadequado e muito pouco sustentado na sua avaliação ambiental.

Thursday, March 08, 2007

Com a devida vénia

Pelo meu prisma
Meu comboio do Tua

O comboio do Tua, como outros comboios que serviam o Portugal mais profundo, só já existe no nosso imaginário.

O último corpo das vítimas da Linha do Tua foi resgatado e, em seguida, uma pedra com o peso de um grande silêncio e indiferença abateu-se sobre ela. Para trás e pendente de conclusão, ficou mais um famigerado inquérito só para entreter e português ver que, neste País, nada fica sem apuramento da verdade, sem avaliação de responsabilidades e sem punição. Exemplos bem convincentes aparecem com frequência à luz do dia, pelo que o povo está cada vez mais confiante nas autoridades que temos.
A morte lenta da Linha do Tua vai, no entanto, avançando, mas sem que o desfecho, há muito previsto, tenha para já data marcada. Sendo a sua saúde muito precária, vai, todavia, sobrevivendo ligada à máquina alimentada pelos autarcas dos concelhos por ela servidos e que lhe proporciona os cuidados intensivos capazes de lhe atrasar a morte. Todos os que amamos a Linha do Tua esperamos que essa luta, dos mirandelenses principalmente, não seja inglória, quanto mais não seja reconvertendo-a e aproveitando-a para fins turísticos. Seria a maneira de preservar um património que faz parte da história e da vida de uma região muito deprimida, esquecida e cada vez mais abandonada pelo poder central, apesar das promessas que sobem de tom em tempo de eleições. Este povo honrado, honesto, trabalhador, do melhor que Portugal tem, anda há muito a ser enganado. É preciso tomar consciência disto, bater o pé e criar novas e mais originais formas de luta, enquanto não nos roubem também a vontade e a esperança.
A comunicação social durante dias, enquanto o produto teve boa venda, falou da Linha do Tua, mas só teve esta grande oportunidade ao fim de 120 anos. Foi preciso ocorrer uma tragédia para que as entidades responsáveis se vissem confrontadas também com os problemas da segurança e com a necessidade da manutenção daquela linha-férrea. Quando tanto se tem investido nas vias rodoviárias, verdadeiros campos onde se trava uma sanguinária guerra civil, com mais baixas do que as que ocorriam nas três frentes da antiga guerra do ultramar, bem podiam aproveitar o exemplo da Linha do Tua para concluírem que as vias ferroviárias são bem mais seguras. Além de mais seguras são também muito menos poluentes.
Os nossos governantes, os actuais de forma escandalosa, fecham e concentram desenfreadamente serviços essenciais para as populações, mandando os utentes para as estradas, tornando o trânsito cada vez mais caótico. Trocam estradas de primeira por urgências de segunda. Só que ao povo não lhe está a agradar nada o negócio. As ambulâncias, por exemplo, também não têm asas ou escudos que as protejam dos acidentes. Os habitantes do interior, onde as distâncias a percorrer são maiores, são os grandes sacrificados desta política cega que só pensa em beneficiar os grandes centros urbanos.
Os comboios deixaram de circular em Trás-os-Montes. Nem a Linha do Douro escapou a essa sanha devoradora dum transporte que, na opinião de políticos vesgos e sem vergonha, deixou de ser essencial. Do outro lado da fronteira, nuestros hermanos vão recuperando "o troço da linha entre Salamanca e Veja de Terrón," como dizia o distinto jornalista Manuel Carvalho, amigo da sua terra e que sente os problemas da sua região, num editorial do Público. Isso acontece mesmo às portas de Barca de Alva, o que devia envergonhar ainda mais os nossos governantes. Assim como não se envergonham que as gentes de Miranda do Douro, para irem a Bragança, tenham que fazer a viagem por Espanha ou os doentes das terras fronteiriças tenham que recorrer a médicos espanhóis e as grávidas tenham que dar à luz os filhos do outro lado da fronteira. A minha mãe pariu-me em casa, porque na minha terra, naquele tempo, não havia ainda luz, parafraseando mais uma vez o meu amigo Morais.
A Linha do Tua está ameaçada de morte, apesar de reunir óptimas condições para o turismo. A paisagem que atravessa é deslumbrante. Uma vegetação frondosa e variada, os vinhedos, as escarpas dos montes, verdadeiras gargantas que se abrem de admiração ao contemplarem aquele serpentear, por vezes apressado, do rio Tua.
É urgente, por isso, que alguém a defenda, senão terá o mesmo fim das outras que atravessavam Trás-os-Montes. Porque não se defendeu, por exemplo, com unhas e dentes o troço da Linha do Corgo entre Chaves e Vila Pouca de Aguiar que servia uma zona de turismo por excelência? Tudo se passou, no entanto, na paz dos deuses e com a maior indiferença dos líderes locais.
A grande ameaça que pende sobre a Linha do Tua é a construção de uma barragem. Para servir quem? Os mesmos senhores de sempre, os do grande capital ou que moram nas grandes cidades. Assim como acontecerá com as eólicas que vão nascendo no cimo dos nossos montes. Para investir nas linhas-férreas de Trás-os-Montes, modernizando-as e viabilizando-as economicamente, não há dinheiro, mas se for para nos sacarem recursos, então aparece sempre. Também não falta dinheiro para enterrar nas vias que servem as grandes cidades de todo o litoral e para se projectarem TGV's.
O comboio do Tua, como outros comboios que serviam o Portugal mais profundo, só já existe no nosso imaginário. É uma saudade imensa recordar a minha primeira partida da estação de Mirandela para Bragança, à procura de conhecimentos para o futuro. Recordar a primeira viagem que fiz ao Porto, já com dezoito anos, para a realização de uns exames médicos. Recordar a viagem que não coube num dia, de Mirandela até Mafra, para frequentar o C.O.M., acompanhado do meu saudoso amigo Ricardo Sequeira, de Miradeses. Recordar ainda a viagem mais longa de comboio, de Lisboa a Chaves, no meu regresso da guerra, depois de dois anos em Moçambique. Recordar, por último, o meu comboio do Tua que serviu de relógio a meus saudosos pais e a outra gente do campo, indicando-lhe com o seu apito a hora do intervalo para descanso e de comerem o naco de pão que o diabo lhes amassava.
Hoje é uma dor de alma ver os antigos edifícios das estações em completa ruína. Por essas linhas encerradas, abandonadas e desmanteladas dói-me, como a outros bons transmontanos, não aos que sobem das capitais para se pavonearem nos congressos, ver circular carruagens invisíveis a abarrotar de desilusão, de tristeza e de saudade.

Data de Publicação: 08/03/2007
Artigo de: Armando Ruivo

Sunday, January 28, 2007

Linha do Tua

uma viagem maravilhosa no trajecto mais espectacular entre Abreiro e Tua.